Daniela Senador: marketing, negócios e paixão pelos livros

By 4 de abril de 2023 abril 18th, 2023 Blog

Daniela Senador sempre traz aos cursos da LabPub o que há de mais avançado em gestão de editoras, pesquisa e marketing dos livros

Nasci num hospital em São Paulo, capital, mas, desde que vim ao mundo até os 20 anos, morei na cidade de Cotia, onde, na época, tudo era mato. Não existia nem iluminação na rodovia para chegar até lá.

Então, apesar da proximidade com a Pauliceia – são cerca de 20 km de distância -, cresci no interior, numa casa grande em rua de terra, circundada por mata fechada, com uma horta na qual havia plantação de tudo, coisa do meu pai: tinha canteiro de cenoura, beterraba, rabanete, couve, morango, laranjeira, limoeiro, goiabeira, bananeira, pé de café e até galinheiro.

E muitas flores – flores por todos os lados. A fauna também era típica – vez ou outra aparecia cobra no quintal, aranhas caranguejeiras, formigonas. Depois que meus pais se separaram, ainda na minha adolescência, morei em outras duas casas em Cotia, uma no pé de uma comunidade, no centro da cidade, outra, no bairro da Granja Viana.

Aos 17 anos fui aprovada para cursar a graduação em Jornalismo (Comunicação Social) na USP e as idas e vindas para Cotia de ônibus se tornaram cansativas. Já estava na hora de levantar voo e, no terceiro ano de faculdade, resolvi morar sozinha em São Paulo, onde estou até hoje.

Eu sou fruto de um encontro proporcionado pelos livros – meus pais são professores de Português e Francês, e se conheceram quando davam aulas na Fundação Bradesco, em Osasco. Cresci em meio aos livros, com pais leitores e estudiosos, que sempre leram para mim e comigo, de pequena à adolescência, quando o desafio se tornou a literatura para vestibular.

Não me esqueço da leitura acompanhada por eles de Vinte Mil Léguas Submarinas, de Júlio Verne, e Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa. Na minha casa havia uma biblioteca imensa, fruto deste encontro. Cresci com os livros de histórias infantis da editora Ática e, mais velha, corria para buscar os da Coleção Vaga-Lume que eles recebiam em primeira mão da editora pelos correios.

No entanto, a entrada na universidade balançou bastante a minha relação com os livros, sobretudo com a literatura.

Li muito, exaustivamente, mas se tratava de uma leitura compulsória que oferecia pouco prazer. Meus anos entre graduação e mestrado foram tomados por livros de estudo. Em relação à literatura, lia pouco. Eu vivia o dilema “preciso ler isto… mas não gosto disto”. E não lia nada, nem uma coisa nem outra. Foram anos para me libertar de obrigatoriedades impostas por mim mesmo do que eu deveria ler, até entender o meu real gosto de leitura e, então, me tornar uma leitora apaixonada e constante, que tem uma mesa de cabeceira tomada por muitos livros desejados. Foi um processo que está intrinsecamente associado ao meu autoconhecimento e evolução.

Quando a velocidade de leitura é menor do que o desejo de ler e o espaço físico para comportá-lo. (É preciso documentar a ausência de Os anos, na caixa de Annie Ernaux, emprestado com muita coragem – e já reavido!; os livros feitos pelo filho Martim, de 6 anos; e  Direito à vagabundagem: as viagens de Isabelle Eberhardt)

 

O segmento editorial é, hoje, aquele com que mais atuo, e me realizo quando estou diretamente envolvida com atividades relacionadas à inteligência de negócios: desenho de planos de negócios para editoras, estimulando, assim, a bibliodiversidade; análise financeira dessas empresas, contribuindo para a sua sustentabilidade; realização de pesquisas para identificar quem são os leitores e potenciais leitores, suas percepções de valor dos livros e hábitos de compra; criação de estratégias de divulgação dos livros e de sua comercialização.

Comecei a minha trajetória no mercado editorial como Gerente de Mídias Digitais da Editora Cosac Naify e, entre as minhas responsabilidades, estava a gestão do e-commerce da editora, o que significava, entre tantas atividades, coordenar, de ponta a ponta, aquelas megapromoções de 50% de desconto em catálogo completo. Como brinco com os alunos, nesta vida – porque não sei se voltarei numa próxima! (risos) – não pretendo mais atuar como gestora de e-commerce. Continuo dando consultoria nesta área, mas não tenho a intenção de vivenciar a dinâmica da função, que é, deveras, bastante complexa e desgastante, independentemente do porte do negócio ou segmento de mercado.

Livro de sua vida?

Talvez você deva conversar com alguém (Lori Gottlieb, Vestígio) me proporcionou uma verdadeira e profunda sessão de terapia.

Já não me recordo de quantas pessoas presenteei com este livro, mas sei que foram muitas.

Tenho verdadeiro encanto pela área de psicologia, suas múltiplas vertentes e a isso se somam as minhas milhares de sessões rumo ao autoconhecimento e à evolução psíquica. Este livro consegue proporcionar reflexões profundas e inspirações práticas a partir de uma escrita simples, clara, objetiva, que articula teorias e vivências. Mas, depois deste, veio Os anos (Annie Ernaux, Fósforo) e a admiração por esta autora, que traz consigo a coragem de dizer aquilo que temos no âmago, nos remoendo as entranhas, com toda a sua autenticidade e coragem. Ela desvela toda e qualquer hipocrisia burguesa a partir da sua experiência com a qual cada um de nós, em algum momento, pode se identificar. São estes dois livros hoje que tem morada permanente na minha mesa de cabeceira.

Momento fã

Estive lado a lado com o professor Antonio Candido em um dos lançamentos da obra de Paulo Emílio Salles Gomes, da Cosac Naify, quando demos carona a ele para o evento no Cinesesc. Foi um momento sublime, que ficou marcado na minha história.

Momento Ministério Especial da Leitura e do Livro: Ministra Daniela Senador

Eu acredito que o hábito de leitura é consequência da experiência de ler livros com os quais exista alguma identificação, independentemente da instância – identificação com o comportamento do protagonista ou de um dos personagens; com o cenário no qual se passa a história e a época; as temáticas que são evocadas e discutidas; a forma como é escrito; a curiosidade que desperta etc.

Não acredito que a construção do hábito de leitura se dê por meio de indicações mandatórias, de leituras compulsórias do que se pressupõe ser necessário, seja por ser clássico, edificante ou carregue consigo qualquer status intelectual.

E acredito que isso precise ser estendido às salas de aula, numa comunhão com as famílias, para que as crianças descubram o livro como algo tão gostoso quanto um brinquedo e, consequentemente, aquilo com o que mais se identificam nele. É preciso que ela conecte o que está no livro com o seu mundo com liberdade e espontaneidade.

Ser professora 

É uma experiência muito rica para mim em diversos sentidos. É o momento em que consigo articular conceitos, que me são tão caros, com a práxis de mercado, e sistematizá-los para, então, transmiti-los aos alunos. Esta experiência traz a sensação de completude do circuito aprendizagem-aplicação-aprendizagem, que é reforçada com a troca com os alunos. O processo de aprendizagem é recíproco e isso é para mim muito estimulante.

Gosto também da criação de novas conexões e, quando isso acontece no mundo do livro, tem um sabor ainda mais especial, pois todos nós estamos atuando em prol dos mesmos propósitos, que são a difusão da leitura, a criação do hábito leitor, a bibliodiversidade.

Recentemente fui convidada para ministrar uma aula na disciplina Mercado Editorial da graduação em Editoração da ECA-USP e acredito que este será um momento marcante da minha vivência como docente, pelo fato de ter a oportunidade de dar aula na mesma instituição em que estudei, mais de 20 anos depois.

 

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